Ao cronista Arthur Xexéo do Jornal O Globo

CARTA MANIFESTO - POR: GATTO LARSEN

Ao cronista Arthur Xexéo do Jornal O Globo

Soube por alto da recente encrenca em que o Senhor se envolveu com a “dança contemporânea” do Rio de Janeiro, mas confesso que não fiz questão nenhuma de ter mais informações a respeito.
Ontem, dia 27 de maio, vendo um site de dança do Sul do país, tive a oportunidade de dar uma olhada na crônica que tanto “espanto” causou entre as pessoas do meio.
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Acredito que liberdade de expressão seja isso sim, cada um diz o que pensa e concordo em muitos pontos com suas colocações, mesmo porque hoje se cometem inúmeros “atropelos” em nome do contemporâneo, assim como se cometeram também, há tempos atrás, com o chamado “experimental”, a tal ponto que poucos diretores têm a coragem de utilizar tal nome para designar seus trabalhos, mesmo que experimentais o sejam.
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Mas sou defensor da livre expressão e do respeito às idéias individuais e da tolerância, seja religiosa, política, artística, filosófica, enfim, há espaço para todos, ou pelo menos deveria haver. E é aí, justamente nesse ponto, que abertamente discordo do conteúdo de seu texto.
Seu texto refere-se a uma dança contemporânea praticada e endeusada na Zona Sul, feita para a Zona Sul e com a cara, com certeza, da Zona Sul. Como se essa fosse a única dança contemporânea no Rio de Janeiro.
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Lamento lhe informar que do mesmo jeito que a imprensa em geral é excludente e seletiva de acordo com seus interesses, o Senhor vem se comportando da mesma maneira. Tomou sua decisão, bateu o martelo e deu sua opinião parcial que, como verdade, fulgura num meio de comunicação que atinge a muitas e muitas pessoas.
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Há muitas mais opções de trabalhos no “reino da dança contemporânea” do que o Senhor imagina, mas as limitações impostas pela exclusão, a falta de interesse e o descaso com o que os jornais importantes negam-se a publicar sempre e fazem com que uma pessoa como o Senhor não vá, não assista, não tome conhecimento e faça também seus atropelos na sua coluna.
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Estou falando especificamente da companhia Rubens Barbot Teatro de Dança, da qual sou produtor há dezoito anos, nos quais viajamos pelo país e pelo mundo, com ótimos aplausos da crítica e de público. Sempre nossa assessoria de imprensa tomou o cuidado de enviar release com as informações, fotos e convites para o Senhor.
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Nunca fez parte da nossa platéia, portanto não pode generalizar (acreditamos). O Senhor não conhece a muitos e nem a nós, que, por sinal, estamos em cartaz com um espetáculo “contemporâneo” sobre os Orixás encenado na Catedral Anglicana de Santa Teresa, que desde o dia 15 de maio lota todas as noites (e o público volta várias vezes).
Mas a companhia é afro-brasileira e não está na Zona Sul e não tem apoio da Rede Globo, portanto por que se incomodar em sair de casa e ir ao Bairro de Santa Teresa assistir a um espetáculo sobre uma cultura que possivelmente não figura na sua ampla informação e cultural geral?
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Lamento que grande parte das redes de comunicação, algo em torno de 90%, atue deste modo e com essa finalidade, mesmo assim, estamos no mercado, “off”, mas estamos há dezoito anos e por opção (se fosse em New York, por exemplo, o Senhor provavelmente fosse e escrevesse. Escrever sobre um espetáculo off em New York dá status).
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Gosto de muitas coisas que o Senhor escreve, mas, muitas vezes, erra o pênalti.

Cordialmente,
Gatto Larsen